Cuidado ao ser fiador em contrato de aluguel de imóvel
Hoje nós queremos chamar a atenção de quem deseja ser fiador em aluguel de imóvel para não correr riscos quando problemas no pagamento do contrato de aluguel ocorrerem.
A família é constitucionalmente reconhecida como base da sociedade e merecedora de tutela especial do Estado, conforme estabelece o artigo 226 da Constituição Federal. Conferindo essa proteção à família, a Lei 8.009/90 estabelece que os imóveis destinados à habitação estão livres de execução.
Porém, a mesma lei apresenta algumas situações que, mesmo preenchendo todos os requisitos do bem de família, a impenhorabilidade será afastada. A mais debatida, é a que consta no art. 3º, VI, no qual prevê a possibilidade de penhora do bem de família do fiador em contrato de locação.
O STF, em julgamento do RE 407.688-8 decidiu pela permanência da exceção de impenhorabilidade do único imóvel do fiador, considerando o referido inciso constitucional.
Para Carlos Roberto Gonçalves (2008) a exceção contida no art. 3º, VI, é incoerente, pois o inquilino tem seus bens como impenhoráveis e o fiador pode sofrer execução do seu bem de família, sua residência.
Álvaro Villaça Azevedo (2002) complementa que "assistimos nesse caso, a execução do patrimônio do fiador, sem possibilidade de exercer o benefício de ordem; a execução do acessório sem a possibilidade de executar o principal".
A matéria é polêmica e ensejará, ainda, muita discussão.
Cuidado ao ser fiador
Afinal, a exceção do artigo 3º, VI, da Lei 8009/90 não se aplica ao inquilino devedor, mas, apenas, ao fiador que a dívida tenha origem num contrato de locação. Evidente que fiador e inquilino possuem obrigações que decorrem do mesmo contrato de locação, desse modo estão em idêntica situação jurídica. Porém, são tratados de formas desiguais, colocando o fiador em grau de inferioridade.
A responsabilidade decorre do mesmo contrato de locação, não podendo o acessório (contrato de fiança) conter mais obrigações que o principal (contrato de locação), pois infringe o princípio da isonomia contido no artigo 5º, caput da Constituição Federal.
Em face a esta realidade, nota-se uma violação ao princípio da igualdade, pois o fiador num ato de solidariedade, deixa sua família à mercê da sorte e de suas possibilidades financeiras, enquanto o locatário está protegido pela impenhorabilidade de seu bem de família.
Flávio Tartuce e Ricardo Castilho (2006) consideram que a Lei de Locações nº 8.245/91, ao introduzir a possibilidade de penhora do único imóvel do fiador, vislumbrou trazer benesses ensejadoras de grande desenvolvimento ao setor imobiliário.
De acordo com os autores, isto ocorreu porque, antes da criação da citada lei, era considerável a dificuldade de locação, uma vez que para efetiva garantia do locador se mostrava pertinente a existência de fiador proprietário de mais de um imóvel, situação que no Brasil, nunca foi comum.
Nossa opinião
É inquestionável o direito de crédito do locador, porém deve-se ponderar o valor de cada direito. Deve-se analisar a essencialidade e o grau de interferência que cada legislação terá na vida de cada um, pois o locador terá outras formas de exigir uma garantia, além de poder alugar novamente seu imóvel.
Já o fiador terá inúmeros prejuízos, sentirá todo dissabor de perder sua casa, além de ter sua saúde física e mental abalada pelo processo de execução.
Defende-se a inconstitucionalidade do artigo 3º, VI, da Lei 8.009/90 por dar preferência ao crédito e não a dignidade do fiador e sua família. Tal artigo viola a proteção à moradia e o princípio da igualdade quando traz mais obrigações para o fiador que para o locatário, e ainda, porque na maioria das vezes quem assume a garantia da fiança não conhece as consequências jurídicas de seu ato, pois quase sempre estão imbuídas de sentimentos de solidariedade e não se atentam a este requisito contratual.
Importante ressaltar que antes do julgamento do Recurso extraordinário 407.688-8 de 2006, o STF já havia considerado inconstitucional a penhora do bem de família do fiador em contrato de locação. Portanto, não se pode colocar um ponto final na discussão, o debate deve continuar, pois há muita divergência sobre o assunto.
Conclui-se que há muitos pressupostos que indicam uma incoerência entre a norma constitucional e a exceção contida na lei que dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família. Diante desta realidade, espera-se que a Suprema Corte reveja sua posição declarando a não recepção do artigo 3º, VI, da Lei 8.009/90, pela Constituição Federal de 1988.
E que o próximo legislador permita qualquer outro tipo de garantia na fiança, menos o único imóvel residencial, que é o mínimo existencial para qualquer ser humano.
Foto: por MundoAdvogados.com.br