Direito Imobiliário: regularização de condomínio em área de preservação permanente

​O loteamento de condomínios irregulares e casas construídas em Área de Preservação Permanente desperta controvérsias.

5 AGO 2015 · Leitura: min.
Direito Imobiliário: regularização de condomínio em área de preservação permanente

De imediato, pode-se perceber que há uma série de princípios legais e constitucionais em conflito: De um lado há o Princípio da Propriedade Privada e do outro lado, há o Direito do Ambiente e, neste, em último grau, o direito da sociedade de usufruir daquele ambiente.

O choque entre princípios e direitos fundamentais sempre é, por si só, um tema gerador de polêmica - ainda mais se tratando de aspectos tão fundamentais quanto a preservação da natureza e da propriedade privada – tendo em vista nenhum deles deve deixar de ser aplicado e não há escala de hierarquia entre eles. Deve-se, portanto, segundo a doutrina, utilizar-se do princípio da proporcionalidade e fazer a aplicação da medida de cada um dos direitos em conflito no caso concreto mediante ponderação de valores ou ponderação de interesses.

Não existe, portanto, uma fórmula pronta para solucionar esse tipo de questão. O Direito de Propriedade envolve muito mais do que o direito real entre o proprietário e o bem, envolve direitos sociais, direitos adquiridos e etc. Existem casos, por exemplo, que o próprio município autoriza a construção do imóvel em certa localidade e, tempo depois – devido à fiscalização, desastre natural e etc. – a região é considerada Área de Preservação Permanente.

E nesses casos, é questionável até que ponto o direito adquirido no usufruto dessa região é levado em consideração nas decisões judiciais, e também a relevância do aspecto social da situação: como quando as famílias não tiveram outra opção ao ocupar a área e não têm perspectiva concreta de mudança.

O Direito do Ambiente, que é um direito fundamental e pode ser entendido como "um conjunto de normas coercitivas reguladoras das atividades humanas que afetam a sanidade do ambiente em sua dimensão global, visando à sua sustentabilidade para as presentes e futuras gerações"[1]. Uma das formas de proteger as áreas ambientais ocorre através da criação da já citada Área de Preservação Permanente (APP), que está regulamentada pelo Código Florestal.

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Sob esse aspecto, a preservação da natureza é mais importante que um interesse particular de manter a propriedade privada e, segundo a legislação: "A intervenção ou a supressão de vegetação nativa em Área de Preservação Permanente somente ocorrerá nas hipóteses de utilidade pública, de interesse social ou de baixo impacto ambiental previstas nesta Lei." [2]Logo, o legislador não deixou margem de discricionariedade ao administrador público competente para autorização das intervenções nessas localidade, uma vez que os conceitos de "utilidade pública", "interesse social" e "baixo impacto ambiental" estão descriminados na mesma legislação.

A jurisprudência indica que, de forma geral, as decisões priorizam a preservação da natureza - conservação das Áreas de Preservação Permanente - e a desapropriação dos moradores, ou quando não, o desfavorecimento deles quanto a serviços básicos, por exemplo. Há casos de decisão favorável a Companhias de Saneamento Ambiental[3] que não fornecem os serviços de água e esgoto a condomínios irregulares, por exemplo. Pois, baseado no princípio de legalidade, não há obrigação de fazer em área irregular que não atende às exigências normativas.

Outro argumento utilizado é que os próprios moradores assumiram o risco de passar por tal situação ao ocupar área pública de forma irregular, e agora recorrem ao judiciário para ver legalizar o ilegal. Alguns juízes vão, além disso, e colocam na sua decisão que o fornecimento desse tipo de serviço no parcelamento irregular acaba funcionando como um "incentivo" à permanência da população na área, minorando o dever de preservação do meio ambiente.

Entretanto, apenas afirmar que a preservação do meio ambiente deve ser prioritária em todos os casos não é a solução mais razoável. A questão social também deve ser levada em conta, pois de acordo com a Constituição: "a propriedade atenderá sua função social" (art. 5º, XXIII); Logo, seja para atender as necessidades mais básicas de um ser humano, seja para fornecer um ambiente digno de moradia e desenvolvimento, a propriedade privada deve ser considerada no processo e deve amenizar as decisões judiciais em relação aos ocupantes da área.

Portanto, a alternativa legal para a resolução de tal embate, seria a não desapropriação das edificações e loteamentos localizados em áreas de preservação permanente, mas a aplicação da responsabilidade civil ambiental pela parte que realizou a invasão da APP.

A desapropriação da propriedade pode ser afastada por se tratar de fato consumado e pela consequente aplicação da limitação administrativa das propriedades. O loteamento em áreas de proteção permanente já provocou o consequente dano a natureza, tratando, assim, de caso irreversível, em que a desapropriação não seria uma medida eficaz e não traria mais benefícios a nenhuma das partes.

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Em resumo, a decisão mais prudente a ser tomada estaria voltada à limitação administrativa das propriedades: que não cabe a desapropriação, mas limita o uso por meio de uma imposição da administração pública. Busca-se, assim, conciliar os princípios constitucionais em conflito, garantindo o direito à propriedade dos donos dos loteamentos com limites impostos pela administração pública que objetivam não agravar a situação e a preservação da APP.

Acionando a responsabilidade civil ambiental aos proprietários dos loteamentos, busca-se o ressarcimento pelos danos gerados contra a coletividade e é passível a aplicação de multa aos responsáveis pelo prejuízo às áreas de preservação permanente. Tais multas objetivam tanto punir os proprietários, quanto indenizar a sociedade – consequente administração pública, no caso- pelos danos causados ao meio ambiente.

É imprescindível a aplicação do princípio da proporcionalidade, ou seja, a indenização deve corresponder à área devastada, a condição de risco na qual o bioma se encontra e a gravidade dos danos realizados. A partir de tais preceitos, torna-se fundamentado o cálculo da multa a ser aplicada.

Assim, das alternativas possíveis, torna-se a mais plausível e viável a não desapropriação das propriedades em área de preservação permanente, e uma regulamentação, aplicação de limitação administrativa às propriedades e o acionamento da responsabilidade civil ambiental dos proprietários, objetivando a indenização deles a sociedade. Assim, é possível a aplicação parcial dos princípios constitucionais em conflito, permitindo que ambos incidam de alguma maneira na decisão final, já que quando se trata dos princípios, não se pode usar o "tudo ou nada", há que se reconhecer a eles uma dimensão de peso ou importância, atribuída à luz dos elementos fáticos do caso concreto.

Escrito por

MSB Advocacia e Consultoria Jurídica

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1 Comentários
  • Kika

    O que é IPTU? Um imposto cobrado por uma área registrada no município! O que é alvará de construção? Uma permissão de construção, numa área, geralmente, registrada no município! Para um bom entendedor, meia palavra basta!