A respeito das férias, tema ainda não pacificado após a reforma do Judiciário
O que fez a EC n° 45/2004, ao acrescentar o inciso XII ao art. 93 da CF/88, foi tão-somente impossibilitar, proibir, as férias coletivas. Neste artigo discutimos este tema.
O que fez a EC n° 45/2004, ao acrescentar o inciso XII ao art. 93 da CF/88, foi tão-somente impossibilitar, proibir, as férias coletivas, ou seja, o fechamento do serviço público de prestação jurisdicional. No que tange ao Estado do Rio Grande do Sul, nunca houve férias coletivas no 1° Grau, sendo a atividade sempre ininterrupta.
No 2° Grau (TJRS), os recessos de janeiro e julho, de fato, eram coletivos – mas subsidiados pelas Câmaras de Férias, após rebatizadas para Câmaras Especiais (art. 25 e seguintes do Regimento Interno do TJRS), ou seja, mantendo em funcionamento o Poder Judiciário.
O art. 186 do COJE/RS, por sua vez, já estabelece – e sempre assim o foi, o que não sofreu qualquer interferência da EC n° 45/2004 – apenas as férias forenses para o 1° Grau, mantendo, portanto, o serviço aberto e ininterrupto para o jurisdicionado (alternando-se os juízes singulares nas suas férias).
Assim, a EC n° 45/2004, para o Estado do Rio Grande do Sul, não poderia ou deveria ter maior repercussão, tratando-se de matéria puramente interpretativa. Com efeito, o que as férias forenses – desde sempre previstas no COJE, como acima visto, e que não se confundem com as férias coletivas – estabelecem é a suspensão dos prazos no período (ex vi do art. 179 do CPC), salvo para as matérias urgentes (de que tratam os arts. 173 e 174 do mesmo Diploma Legal).
E isso se coaduna com a Carta Magna. De fato, trata-se de alívio não só para servidores e magistrados (e sabemos as dificuldades geradas na formação dos órgãos julgadores e as distorções na distribuição dos feitos nos Tribunais a partir da orientação no sentido do fim das férias forenses) mas, inclusive, para o advogado (arts. 133 da CF/88 e 2° do EOAB), que também necessita de ao menos um período de descanso anual. Não se pode levar ao extremo a celeridade e a tecnicidade estatística, sob pena de desproporcionalidade com outros valores e princípios resguardados pela Constituição, como o valor social do trabalho e o direito ao lazer (arts. 1°, IV, e 6° da CF/88).
A EC n° 45/2004 se fez necessária, e é interessante buscar seus motivos, porque em alguns Estados da federação havia férias coletivas, em 1° e 2° Graus, com paralisação das atividades forenses. Exemplo disso era o Estado do Ceará, cuja regulação nesse sentido fora objeto da ADIN n° 3.085 perante o STF, o qual, diante da superveniência da EC n° 45/2004, acabou por julgá-la prejudicada.
Nesse passo, entende-se possível uma interpretação do art. 93, XII, da CF/88 coadunada com todos os valores resguardados pela Carta Maior, sem prevalência de qualquer deles – desde a necessária celeridade, objeto da Reforma do Judiciário, até a garantia da dignidade da pessoa humana: in casu, do operador do Direito (seja ele servidor, magistrado ou advogado), voltando este a ter um período organizado e, sobretudo, necessário de descanso anual.
Nos parece que esta foi a hermenêutica que norteou a atual orientação do CNJ, revogando seu anterior posicionamento: não se trata de permitir férias coletivas, mas sim deixar claro que as férias forenses (a suspensão dos prazos processuais por um mês) – que continuam previstas no CPC – não foram revogadas pela EC n° 45/2004.
Humanizar a eficiência do serviço público (arts. 1°, III, e 37, caput, da CF/88). Afinal, este é o fundamento e o fim maior de um Estado Democrático e Social de Direito.
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